agosto 26, 2010

Nijinski por Rodin

Nijinski por Rodin


9 comentários:

  1. Nijinsky – casamento com Deus

    Provocação de Tiago Luz em 29 de agosto de 2010

    Quando o público entra na sala, o homem já está no palco.

    Estático ou caminhando muito lentamente.
    Há pouca luz, não enxergamos bem.

    Sobre o palco, e sobre o homem, é projetada uma imagem de galáxia, nebulosa, que gira eternamente.

    Parece haver gelo seco, daquele que fica bem próximo ao chão.

    Primeiro sinal.
    Segundo sinal. Ouve-se um som. Um cometa passou? A voz de Deus?

    O homem permanece no seu estado. A galáxia gira. Todos respiramos.
    O gelo começa a se dissipar, revelando o espaço.

    Terceiro sinal. Enquanto se ouvem os avisos de segurança, desligamento dos aparelhos sonoros etc., a nebulosa vai desaparecendo.

    Resta o homem no espaço. O homem e alguns objetos.

    Com um pouco mais de luz é possível reconhecer uma raquete de tênis, um delicado chapéu feminino, um grande recipiente com gelo, parece gelo, dentro.

    O homem olha o horizonte. Onde estará?
    O homem olha para o alto. O que tem lá?

    Respira. Respiramos todos.

    No silêncio, parece silencioso, mas se houvesse um som ele não seria reconhecível, o homem começa a caminhar pelo espaço.
    Procura algo?

    De repente ele parece voltar a ser criança. Está ansioso, como um menino que descobriu alguma coisa.

    Olha de novo para o alto.
    Parece ser repreendido.

    O homem reaparece. Parece cansado. Volta a procurar.

    Um som. Frio. Outro som. Fome.

    O homem procura com mais urgência.
    Da voltas pelo espaço, mas parece que ele não percebe que anda em círculos.

    Ele pensa: Sei que todo mundo vai pensar que tudo é inventado, mas devo dizer que tudo é a pura verdade, pois eu vivi tudo isso na prática.

    (continua)

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  2. Essa caminhada parece não ter fim.

    O homem se cansa.
    Procura um lugar para se sentar.

    Não, não é isso. Ele não quer descansar. Não quer sentar.
    Alguma coisa no seu corpo o incomoda.

    Ele vai até o delicado chapéu feminino. Duvida.

    Volta a procurar.
    Olha para o alto. As mãos seguem o movimento do olhar.

    Quer escutar algo.
    Nada acontece.

    Respira. Respiramos todos.

    Corre até a raquete de tênis. Assusta-se.

    Encontra um monte de moedas. Reflete. Parece não saber o que fazer com elas.
    Corre pelo espaço circular com as moedas em mãos.

    Teria roubado? Estaria levando para alguém?

    Escolhe um ponto do espaço e delimita um espaço também circular com as moedas. Coloca-se dentro desse espaço. Ali, ele dança.

    Fim da dança. Olhar para o alto, como alguém pedindo aprovação.

    Volta a procurar. Fome e frio.

    Decidido, se dirige a um ponto do espaço.
    Está doente da alma. Mesmo assim, mesmo doente, se relaciona com o delicado chapéu feminino.

    Ele pensa: Fugi de casa, pois minha mulher não me compreendeu. Minha mulher me atrapalha, porque sente. Teve medo de mim, e eu tive medo dela. Fugi de casa. Não fui compreendido.

    (continua)

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  3. O homem está no chão. Teria morrido?

    Alguma força o convoca a ficar de pé. Ele corresponde imediatamente.

    E agora?

    Fome.

    O homem olha para o alto. As mãos seguem o movimento do olhar. O corpo todo parece querer subir.

    Ele sente que algo o incomoda no seu corpo.

    Parece cansado.

    Volta a procurar. Anda em círculos.
    Quer se sentar. É o que parece.

    O homem volta a ser menino. O menino encontra um objeto cheio de gelo. Brinca com ele. Parece muito contente, muito divertido.

    O menino desaparece como mágica.
    Resta o homem.
    Ele parece confuso.

    O homem corre até uma parte do espaço onde há uma pequena elevação.

    O homem quer subir. Ele parece buscar alguma coisa lá em cima.

    Ele fica desesperado.

    O homem encontra mais moedas no espaço. Ele desenha outro circulo de moedas, se coloca no meio delas e dança.

    Quando o homem termina de dançar, ele junta todas as moedas do espaço e as deposita próximo do delicado chapéu feminino.

    O homem volta a procurar.

    Às vezes ele caminha de cabeça baixa, como se fosse culpado.

    Frio.

    Algo parece incomodar no seu corpo.
    O homem tira um papel. Não sabe o que fazer com ele. Guarda-o novamente.

    Respira. Respiramos todos.

    Olha para o alto. As mãos seguem o olhar. Todo o corpo quer subir. Mas o homem cai.

    Ao sentar-se, o homem parece estar segurando livros em suas mãos.
    Ele se relaciona com os livros.
    Ele também se relaciona com o delicado chapéu feminino.

    Por fim, ele parece entregar os livros para o delicado chapéu feminino.

    O homem está triste. Olha para o alto.
    Espera alguma coisa. Quer ouvir alguma coisa, qualquer coisa.

    Fome. Ele volta a procurar.

    (continua)

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  4. O homem para diante da raquete de tênis.
    Parece que chora.

    Ele volta a correr pelo espaço circular.

    O homem se dirige à elevação. Ele quer subir.
    Como não consegue, o homem se dirige a um canto do espaço e parece sentar-se como alguém que ficará sentado para sempre.

    De repente, o homem sente uma força que o levanta.
    Ele se põe a caminhar.

    O homem encontra charretes carregadas de madeira.
    Caminha ao lado delas.

    OFF: que o homem descendo do macaco, não foi Nietzsche quem disse, mas Darwin. Perguntei a minha mulher hoje de manhã, pois tive pena de Nietzsche. Gosto de Nietzsche. Ele não me compreenderá, pois pensa. Darwin é um sábio. Minha mulher disse que ele escrevia coisas sábias em francês, isso se chama História da natureza. A natureza de Darwin é inventada. A natureza é a vida, e a vida é a natureza. Eu amo a natureza. Sei o que é a natureza. Compreendo a natureza, pois sinto a natureza. A natureza me sente. A natureza é Deus, eu sou a natureza. Não gosto da natureza inventada. Minha natureza está viva. Eu estou vivo. A natureza é uma coisa soberba.

    O homem vê um cavalo.
    Ele se torna o próprio cavalo.

    OFF: a natureza é a vida. A vida é a natureza. O macaco é a natureza. O homem é a natureza. O macaco não é a natureza do homem. Eu não sou o macaco no homem. O macaco é Deus na natureza, pois sente os movimentos. Eu sinto os movimentos. Meus movimentos são simples. Os movimentos do macaco são complicados. O macaco é bicho. Eu sou bicho, mas sou dotado de razão. Sou um ser dotado de razão, e o maçado não é dotado de razão. Creio que o macaco descende da arvore, o homem, de Deus. O homem tem mãos e o macaco também. Eu sei que, pelas matérias orgânicas, o homem parece com o macaco, mas pelas do espírito, não parece.

    O cavalo volta a ser homem.

    O homem olha para o alto. As mãos seguem o movimento do olhar. O corpo todo parece querer subir.

    Ele sente que algo o incomoda no seu corpo. Parece cansado.

    Ele volta a correr pelo espaço circular.

    (continua)

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  5. O homem se dirige à elevação. Ele quer subir. Subir parece ser sua única saída.

    De novo ele sente que algo o incomoda no seu corpo. Ele tira o mesmo papel. Parece ser uma carta.

    O homem parece ler a carta em silêncio.

    Ele se dirige ao delicado chapéu feminino.

    Respira. Respiramos todos.

    O homem desiste da carta.
    Volta a procurar.

    Fome e frio.

    Ele pensa: Sou um homem, e não Deus. Quero ser Deus, por isso trabalho sobre mim mesmo. Quero dançar. Quero desenhar. Quero tocar piano. Quero escrever versos. Quero compor balés. Quero amar todo mundo. É meu objetivo na vida. Eu sou Deus. Eu amo todo mundo. Não admito fronteiras nos Estados. Eu sou o globo terrestre. Sou a terra.

    Ele volta a correr pelo espaço circular.

    O homem se dirige à elevação. Ele quer subir. Subir parece ser sua única saída.

    O homem realiza movimentos frenéticos e repetitivos, sempre na tentativa de subir.

    OFF: Tenho casa em toda parte. Moro em toda parte. Não quero possuir nada, não quero ser rico. Quero amar, amar. Eu sou o amor, e não a ferocidade. Não sou uma besta sedenta de sangue. Eu sou um homem. Sou um homem. Deus está em mim, e eu estou Nele. Eu o quero. Eu o busco. Quero que publiquem meus manuscritos, pois sei que todo mundo pode ler, mas espero o melhoramento. Não sei o que é preciso para isso, mas sinto que Deus os ajudará em suas buscas. Eu sou um buscador, pois sinto Deus. Deus me procura, por isso nós nos encontramos um ao outro. Eu penso pouco, por isso compreendo tudo o que sinto. Sou o sentimento na carne e não a inteligência na carne. Eu sou a carne. Eu sou o sentimento. Eu sou Deus na carne e no sentimento. Eu sou um homem, e não Deus. Eu sou simples. Não é preciso me pensar. É preciso me sentir, me compreender através do sentimento. Os sábios refletirão sobre muitas coisas, e quebrarão a cabeça, pois o fato de pensar não lhes dará resultado algum. Eles são bichos. São bichos. São vianda. São a morte. Eu falo simplesmente e sem nenhuma macaquice. Eu não sou um macaco. Sou um homem. O mundo descende de Deus. O homem vem de Deus. Aos homens é impossível compreender Deus. Deus compreende Deus. O homem é Deus, por isso compreende Deus. Eu sou Deus. Eu sou um homem. Eu sou bom, e não um bicho. Sou um animal dotado de razão. Tenho uma carne. Sou a carne. Eu não descendo da carne. A carne descende de Deus. Eu sou Deus. Eu sou Deus. Eu sou Deus...


    (continua)

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  6. O homem recolhe desesperadamente as moedas próximas do delicado chapéu feminino.

    Ele parece não saber o que fazer com elas.

    Espera uma ordem vinda de algum lugar. Do alto.

    O homem começa a fazer um circulo com as moedas no chão.

    De repente sente um chamado. Parece vir do alto.
    O homem olha para o alto. As mãos seguem o movimento do olhar. O corpo todo parece querer subir.

    Ele volta a correr pelo espaço, tentando usar a elevação do espaço para subir.

    Ele não consegue decidir entre as moedas e a subida.

    Ele tenta subir com algumas moedas.
    Elas caem.
    Vem uma chuva de moedas.
    O homem não tenta se esconder dela.
    Calmamente se dirige à montanha.
    Fim da chuva.
    O homem observa.

    Respira. Respiramos todos.

    (continua)

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  7. O homem está no alto de uma montanha.

    Ele pensa: Encontro-me diante de um precipício onde eu poderia cair.

    Ele diz: mas não tenho medo de cair, por isso não cairei. Deus não quer que eu caia, pois me ajuda quando eu caio.

    O homem parece brincar com a própria sorte.
    Ele desafia as alturas.
    Desafia a gravidade.
    Desafia Deus.

    De repente algo parece chamar sua atenção. Algo como um rastro sobre a neve, no chão.

    Ele desce imediatamente. Atraído pelo rastro.

    Ele vê o rastro. Ele tenta descobrir de onde vem. Desconfia. Foge para o outro lado.

    O homem sente medo.

    Ele volta sobre seus passos.

    Ele pensa: Deus quer me experimentar para ver se tenho medo dele ou não.

    Ele diz em voz alta: não, eu não tenho medo de Deus, porque ele é a vida e não a morte.

    Ele volta para o alto da montanha, para o precipício.

    Ele pensa: há um homem pendurado aqui e é preciso salvá-lo.

    O homem ouve uma voz. Seria Deus?

    Ele pensa: deve ser o diabo me tentando, como tentou cristo quando ele estava no alto da montanha, dizendo: Pula, então acreditarei em ti.

    O homem sente medo.

    (continua)

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  8. O homem sente uma força atraindo-o para o precipício.

    O homem cai nele.

    O homem se surpreende ao ficar preso nos galhos de uma árvore.

    Ele pensa: é um milagre. Compreendi Deus.

    Ele diz: é um milagre. Compreendi Deus.

    O homem tenta se soltar.
    Deus não permite.
    O homem fica lá por um tempo.
    O homem tenta se soltar.

    Ele ouve: volta a tua casa e diz a tua mulher que estás louco.

    O homem se solta e volta a caminhar pelo espaço.

    Frio.

    O homem revê o rastro. Ele volta de novo sobre seus passos.

    Ele ouve: alongue-se na neve.

    O homem se dirige ao gelo e faz alongamentos sobre ele.

    Ele sente o frio da neve. Sua mão começa a congelar.

    Ele volta sobre seus passos.

    Ele ouve: alongue-se de novo, na neve.

    O homem se dirige ao gelo e novamente faz alongamentos sobre ele.

    Ele fica ali por um bom tempo.
    De repente se levanta.

    Ele ouve: você pode voltar pra casa.
    E o homem se põe a andar.
    Ele ouve: pára. Ele pára.

    O homem percebe que está sobre o rastro.

    Ele ouve: volta sobre seus passos.
    Ele volta sobre seus passos.
    Ele ouve: pára. Ele pára.

    Respira. Respiramos todos.

    (continua)

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  9. OFF: Eu sou Deus num corpo. Todo o mundo possui este sentimento, mas ninguém o usa. Deus é um fogo na cabeça. Eu me pareço com ele, com Cristo, só que ele tem um olhar calmo, e meus olhos se dirigem por toda a parte à minha volta. Sou um homem do movimento, não da imobilidade.

    O homem volta a procurar.

    O homem volta a buscar a subida.
    No alto parece estar sua única e última saída.

    O homem se depara com um espelho d’água.
    Ele para e se mira.

    A fumaça começa a tomar conta do espaço novamente.

    Ele diz: Não quero que digam que eu sou um grande homem. Eu sou um homem simples que sofreu muito. Acho que Cristo não sofreu tanto quanto eu tive de sofrer ao longo de minha vida. Eu amo a vida e quero viver.

    De repente o homem está de novo na montanha.

    Ele parece realizar uma prece. Uma prece com todo o seu corpo.

    Seu corpo é elevado às alturas.

    A luz vai se apagando lentamente, enquanto apreciamos a dança da fumaça.

    Ao piano, um enterro.
    Ou talvez o silêncio.

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